#Leite: é o mercado interno que decide

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É Importante atender primeiro ao mercado interno com leite de qualidade e em quantidade, principalmente agora que o padrão de vida do brasileiro melhorou e a expectativa é de expansão do consumo nos próximos anos. 

Volume captado, de 33 bilhões de litros anuais, é consumido internamente e anima pecuaristas de São Paulo e Bahia

É Importante atender primeiro ao mercado interno com leite de qualidade e em quantidade, principalmente agora que o padrão de vida do brasileiro melhorou e a expectativa é de expansão do consumo nos próximos anos. Exportar vem em segundo lugar.” Assim, sem floreios, Alecsandro Regis Rezende Fortes, pecuarista do interior de São Paulo, dá opinião sobre o presente e o futuro da pecuária no país, que produz mais de 33 bilhões de litros de leite ao ano – é o quarto do mundo – e cujo volume é integralmente destinado às mesas de sua população.

Regis, de 40 anos de idade, não faz uma análise de principiante. Ele sabe do que está falando, pois pertence à quarta geração de produtores da epopeia iniciada pelo bisavô, Antonio de Carvalho Fortes, vindo de Portugal no alvorecer do século passado e que mais tarde cedeu o nome à unidade da Cooperativa do Médio Vale do Paraíba (Comevap), em Taubaté, município onde se localiza a Fazenda São Sebastião, de Regis, da mãe e três irmãs.

A São Sebastião mostra que é possível produzir em escala e com qualidade, gerando lucro e empregos numa região de morros íngremes e temperaturas das mais elevadas do Estado. Do pé da montanha é possível observar as novilhas embaixo das árvores, 100 metros acima, se protegendo do sol abrasivo que castiga. Só de tardezinha ou de noite elas descem e se esparramam para o pastoreio. Todo o rebanho – 600 cabeças – é formado pela raça brasileira girolando, cruzamento da rústica gir com a fértil holandesa. “A girolando consegue suportar clima e topografia adversos. E, bem tratada, fornece muito leite”, afirma Regis.

A média diária das vacas está ao redor de 20 litros, com 180 fêmeas em lactação. É uma das maiores do Brasil, cuja média geral patina e é pouco superior a 5 litros. Já a produção diária da São Sebastião, destinada à Comevap, é de 3.600 litros de leite. A mensal vai a 108.000 litros. “No período das chuvas, encerrado há pouco, a quantidade diminui. Já na entressafra, cocho reforçando a dieta, o número de vacas em lactação sobe a 230 e a litragem diária emplaca 4.600 litros”, informa Regis. O programa de parição das fêmeas é sincronizado um ano antes para os meses de maio e junho próximos. “Pelo menos 40 novilhas dão à luz seus bezerros e começam a ser ordenhadas”, explica o fazendeiro.

“A fazenda consegue bom desempenho no calor intenso e topografia acidentada e trabalhando exclusivamente com a girolando, por conta da somatória de genética comprovada no leite, tecnologia, manejo seguido à risca e capim à vontade”, informa o pecuarista, apontando orgulhoso para as capineiras de napier, que produzem silagem e cujos silos trincheiras são estrategicamente construídos ao lado delas, o que facilita o armazenamento, o transporte e aplaca os custos de mão de obra. Regis lembra que seu pai há décadas foi buscar touros gir do tradicional criatório mineiro da marca Brasília, enquanto o sangue holandês ele trouxe de Castro, no Paraná, região que abriga a bacia leiteira mais desenvolvida do Brasil. “Meu pai pressentiu a necessidade de modernizar a fazenda diante dos desafios que se desenhavam para o leite. O tempo lhe deu razão”, observa.

O dia na São Sebastião começa cedo: às 4 horas da matina. Basta o retireiro abrir a porteira dos piquetes para as vacas surgirem e depois caminharem mansamente até a sala de ordenha, que começa às 5 horas e se estende até às 8h30. À tarde, o ritual se repete e a operação vai das 14 horas às 17h30. As vacas em lactação vivem em sistema semi-intensivo. Logo após a ordenha, comem silagem de capim napier, cevada úmida e polpa cítrica. Depois, retornam à pastagem. “O pasto é a base. Por essa razão, é cultivado aqui como uma lavoura”, diz Regis, que não trabalha com farelo de soja e milho moído por conta da rusticidade do gado. Ele busca, assim, uniformizar os custos diante dos altos e baixos inerentes às cotações dos grãos.

A São Sebastião tem área de 200 alqueires paulistas, sendo 160 usados com a pecuária. O restante é mata virgem. Focada no bem-estar animal, a fazenda formou 27 piquetes e, diferentemente de outras propriedades, não faz revezamento de animais. Os animais permanecem em suas respectivas áreas, e o sistema tem uma explicação. “Mantenho confortavelmente apenas três ou quatro novilhas por alqueire, sem forçar o pisoteio ”, diz Regis.

Segundo o pecuarista, a garantia de um mercado interno aquecido e promissor incentiva a atividade na São Sebastião. “Óbvio que a exportação também é relevante, porém, está sujeita a variações, como câmbio, e a entraves colossais que outros países exportadores impõem ao conceder vultosos subsídios às fazendas.” Já dentro do Brasil, o consumo se eleva há anos e em maior velocidade em Estados como os do Nordeste e do Norte, que antes viviam um pouco à margem da mesa. “Por essas razões, nosso foco é o abastecimento interno”, ressalta.

Assim pensa também Craig Bell, diretor do grupo neozelandês que adquiriu a Fazenda Leite Verde, em Jaborandi (BA). “Nunca pensamos em exportação. Todo nosso projeto é direcionado ao mercado interno. Achamos que existe oportunidade para diferenciar o leite baseado em alta qualidade da matéria-prima, além de pasto e genética para produzir um tipo mais rico e cremoso, valorizado, entre outros, pelos cafés, que querem uma espuma densa.“ Segundo Bell, a Leite Verde valoriza a sustentabilidade, ao conservar 75% de sua área como reserva permanente.

Os neozelandeses acreditam, informa Bell, que oconsumidor brasileiro está se sofisticando e nichos para leites diferenciados brotaram no país. “Alguns clientes desejam mais que o leite comum”, diz o empresário, ressaltando que a fazenda emprega um tratamento térmico suave para preservar os sabores agradáveis do produto.

Regis e Bell têm razão. “Há uma década, o Brasil consumia 90 litros de leite per capita. Hoje, cada brasileiro bebe 180 litros, ou seja, o dobro, índice que vai subir mais. Nenhum outro país apresentou salto dessa dimensão”, afirma Jorge Rubez, presidente da Leite Brasil, entidade que agrega os produtores de todo o país “Há ainda espaço para ser ocupado, pois a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO) recomenda 200 litros por cabeça como ideal.” Segundo Rubez, a renda dos brasileiros melhorou e é refletida no incremento das vendas de lácteos. “Faz tempo que leite em pó e fluído, iogurtes, manteigas e queijos viraram habituais nos carrinhos de compras nos supermercados”, diz. Tem mais: pesquisas indicam a tendência de o brasileiro procurar produtos mais saudáveis e saborosos, enquanto fazendas e indústrias se preparam para atender a esse mercado. Rubez pondera: “Quanto às exportações, acontece que a Nova Zelândia, responsável por 95% das exportações mundiais de lácteos, e os EUA, também poderosos, subsidiam pesadamente a produção. O mesmo vale para a Europa, cuja montanha de dinheiro oficial impede a competição”. Em consequência, o Brasil, imbatível no que diz respeito a custos baixos nas fazendas, não consegue embarcar nada. Ou seja, Rubez considera relevante também o mercado externo, gerador de divisas fortes, mas acusa de desleal a concorrência. “No caso específico dos EUA, eles não vivem sem subsídios. Não conseguem”, enfatiza.

Não há sobras

A relevância do pujante mercado interno de leite e derivados é unanimidade entre pecuaristas, seus representantes diretos, analistas e pesquisadores. Alguns acham que o foco deveria concentrar-se exclusivamente no abastecimento local. Outros acrescentam que o mercado externo deve também ser contemplado à medida que surjam excedentes de produção. Mas não há sobras. Em 2013, por exemplo, de um volume total ao redor de 33,5 bilhões de litros captados, menos de 0,5% pode seguir rumo a outros países, informa Rafael Ribeiro, analista da Scot Consultoria, de Bebedouro (SP). “É que o mercado interno representa mais de 99% do total de leite produzido no Brasil, em termos de consumo.”

Como não consegue suprir a demanda de sua população, o Brasil teve de importar cerca de 600 milhões de litros em 2013, quantidade que Ribeiro considera pouco expressiva diante da enxurrada que o país capta, mas que irá aumentar. O dilema, explica Rafael, é que o acréscimo da demanda por leite e derivados no país tem sido maior que o crescimento da produção. “Assim, se não houver investimentos na cadeia produtiva, podemos virar importadores potenciais de leite da Argentina e do Uruguai, nossos principais vendedores.”

 

Melhoria no padrão de vida fez consumo dobrar de 90 para 180 litros EM DEZ ANOS

Baseado em expectativas da FAO, Duarte Vilela, chefe da Embrapa Gado de Leite, de Juiz de Fora (MG), informa que, se o Brasil mantiver os recentes indicadores de aumento de consumo, poderá se tornar um grande importador de lácteos em 2023, internalizando um volume próximo a 3,5 bilhões de litros. Dá dimensão da poderosa demanda interna o volume total de leite que será captado até 2023: numa expectativa considerada conservadora, com crescimento anual abaixo de 2%, a produção pode chegar a 41 bilhões de litros. E não será suficiente.

Rafael Ribeiro faz uma leitura sucinta e definitiva da exportação: “Vejo potencial para crescimento da participação do Brasil no mercado internacional em longo ou longuíssimo prazos.” Porém, ressalva, é preciso fazer a lição de casa: qualidade do leite, problemas logísticos, homogeneidade na produção.

O ano de 2013 foi bom para a Fazenda São Sebastião, assim como para a pecuária brasileira. Os preços cobriram os custos e a margem gratificou. Profissional ao extremo – “Vivo do leite e da fazenda” –, Regis complementa a renda negociando vacas de quarta ou quinta crias, um mercado apetitoso por conta da intenção dos fazendeiros em aumentar a produção de leite. A São Sebastião espelha também o mercado nacional nesses primeiros meses do ano. O clima quente e seco prejudicou a produção em importantes bacias e fez os preços subir. Regis, que recebeu até R$ 1,20, computado o prêmio pago pela qualidade, estava satisfeito.

Preço ao consumidor sobe

A demanda aquecida neste ano elevou a cotação do leite longa vida, em média, em 6,4% para o consumidor no final de março em relação ao mesmo mês de 2013. A informação é da Associação Paulista de Supermercados (Apas). Além do consumo interno em alta, as cotações do longa vida – o mais procurado nas gôndolas e termômetro de preço – foram impactadas pela estiagem, que perdura desde o final do ano passado e levou à queda da produção nas fazendas. Como resultado, a dona de casa, que já havia desembolsado mais dinheiro para pagar o leite em 2013, deve conviver com preços em elevação nos próximos meses, por conta da oferta restrita de matéria-prima, segundo analistas entrevistados. E o verão, época das chuvas e da abundância, ficou para trás.

Em março último, por sinal, o preço dos semielaborados (leite, cereais e carnes) apresentaram alta de 2,36%. O impacto maior foi ocasionado pelo leite, que subiu 6%. A Apas informa que o consumo de leite não diminuiu, apesar do incremento no preço.
Em todo o ano de 2013, segundo a entidade, o leite longa vida registrou aumento de 15,74%. Subiram também outros derivados, como queijo, manteiga e iogurte.

Em síntese, o pecuarista foi melhor remunerado em 2013, o consumidor pagou mais pelo leite e o consumo não cedeu. Esse cenário pode se repetir em 2014. Em março último, por exemplo, a média ao produtor subiu para R$ 0,94 o litro de leite, ou 3,22% maior em comparação a fevereiro.

http://revistagloborural.globo.com/Noticias/Criacao/Leite/noticia/2014/05/leite-e-o-mercado-interno-que-decide.html

 

 

 

 

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Así lo expresó Domingo Possetto, secretario de la seccional Rafaela, quien además, afirmó que a los productores «habitualmente los ignoran los gobiernos». Además, reconoció la labor de los empresarios de las firmas locales y aseguró que están «esperanzados» con la negociación entre SanCor y Adecoagro.

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