#“A seca mostrou que a estrutura de armazenagem do Nordeste ainda é frágil”

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Ministro Fernando Bezerra diz que ocorreram muitos avanços na região, mas é preciso investir mais na segurança alimentar dos rebanhos e em tecnologias

Guardião de uma das duas pastas destinadas ao PSB no governo Dilma Rousseff, Fernando Bezerra, chefe da pasta de Integração Nacional, demonstra que pretende seguir até o fim desta gestão, fiel í  presidente. Mostra-se extremamente preocupado com a escassez de água no Nordeste, nesta que é a pior seca dos últimos 50 anos. Mas rechaça qualquer menção í  imagem de um Nordeste de retirantes, famintos e migrantes.

Nascido em Petrolina, no sertão pernambucano, Fernando Bezerra de Souza Coelho acompanhou inúmeros ciclos de seca no semiárido. Diz que nunca viu tamanha escassez de água como a que acontece agora. Entretanto, ao comparar os dias de hoje aos do passado, afirma que as condições humanas são bem diferentes. “Hoje temos segurança alimentar para as pessoas.” Ele acrescenta, porém, que a seca mostrou a fragilidade de estrutura no Nordeste. “Não tem estrutura para guardar o milho. Tem que investir mais na armazenagem.”

Segundo Bezerra, os programas de inclusão social que se desenvolvem desde o governo Lula, mais as medidas emergenciais lançadas entre o ano passado e o atual, no total de R$ 16,6 bilhões, vão assegurar uma saí­da para o sertanejo. Entre as novas medidas que ele cita está renegociação da dí­vida dos agricultores afetados pela seca. O pagamento das dí­vidas contratadas de 2012 a 2014 foi prorrogado por um perí­odo de dez anos. O iní­cio do pagamento, no caso de agricultores empresariais, será em 2015; no caso de agricultores familiares, 2016. Os agricultores familiares terão ainda um bí´nus de adimplíªncia de até 80%.

Outra medida, é a manutenção dos programas Garantia-Safra e Bolsa Estiagem enquanto durar o perí­odo da seca. Serão incorporados um total de 361.586 novos beneficiários ao Bolsa Estiagem, que beneficia atualmente 880 mil agricultores em 1.311 municí­pios. O Garantia-Safra atende hoje 769 mil agricultores em 1.015 cidades.

Como deputado constituinte relator da comissão que tratou da partilha de recursos entre União, estados e municí­pios, Fernando Bezerra acompanha com tranquilidade as discussões tensas que ocorrem em torno do novo pacto federativo, em que estão em jogo os fundos de participação dos estados e dos municí­pios, a unificação da alí­quota de ICMS e o Fundo de Desenvolvimento Regional.

Os estados do Nordeste estão alarmados com a seca. O semiárido está no segundo ano seguido de estiagem. Quais os objetivos das medidas emergenciais que a presidente Dilma anunciou?

Estas ações estão voltadas, primeiro, para garantir renda mí­nima para que as pessoas possam ter acesso a alimentação e manutenção de suas propriedades. Para ter as condições de enfrentar este momento mais crí­tico. Estamos ampliando a operação carro-pipa. Hoje temos 4.600 carros pipas e estamos com autorização para ir a 6.100 carros. Outra ação é a manutenção do bolsa-estiagem e do garantia-safra. Em outra frente, estamos ampliando e reforçando a oferta de milho. E também tem a renegociação das dí­vidas dos agricultores. A dí­vida está sendo prorrogada por dez anos.

Existe uma demanda por parte dos estados para a criação de um programa de reconstituição do pasto e do gado, já que as perdas são incalculáveis e eles precisam se preparar para quando a chuva voltar. Como o governo está analisando isso?

Isso vai ser coordenado pelo MDA (Ministério do Desenvolvimento Agrário) com a participação da Embrapa e dos ministérios da Agricultura e da Integração. í‰ uma grande discussão sobre os instrumentos que serão oferecidos. Sejam instrumentos de crédito, sejam instrumentos de pesquisa, inovação, definição de alternativas para alimentação animal. A ideia é que a gente também possa avançar numa coisa que esta seca revelou que nós temos ainda muitas fragilidades. Esta seca mostrou que nós avançamos muito no que diz respeito í  segurança alimentar da população. Não há mais a imagem de retirantes, dos esfomeados, dos migrantes. Porque ao longo dos anos se montou uma rede de proteção social muito importante no Brasil e de forma particular no Nordeste. Também na segurança hí­drica se conseguiu avançar bastante, com implantação de adutoras, de barragens e distribuição de cisternas.

E quais foram as fragilidades que esta seca revelou?

Ainda temos muito que fazer no que diz respeito í  segurança alimentar dos rebanhos. í‰ preciso uma discussão que envolva não só o reforço e a infraestrutura. Mas que também envolva a introdução e disseminação de tecnologias que possam dar sustentabilidade produtiva í s atividades desenvolvidas na zona rural do semiárido.

Quais os caminhos?

Identificar cada vez mais áreas a serem irrigadas para que se possa produzir silagens, ter o hábito de no tempo dos bons invernos ou ainda aproveitar as áreas passí­veis de irrigação para produzir comida para ser guardada. A seca mostrou também a fragilidade da estrutura de armazenagem do Nordeste. Vocíª não tem nem como receber o milho. Não tem estrutura para guardar o milho. Tem que investir mais na estrutura de armazenagem.

Dilma se disse surpreendida com a seca. O sistema de prevenção, criado em 2011, com o Cemaden e o Cenad, ainda deixa a desejar?

Quando a presidenta Dilma disse isso, estava se referindo ao segundo ano de seca. Na realidade, na primeira seca, em abril quando nós já tí­nhamos as informações do Cemaden (Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais), do Inpe de que iria se confirmar um ano seco, as primeiras providíªncias foram anunciadas, em abril do ano passado. Não se esperou nem terminar o ciclo de chuva. Não é fácil. Estamos falando de 10 milhões de pessoas afetadas nos estados com situação de emergíªncia reconhecidos. Então, a surpresa de que ela fala é que depois de um ano seco o normal seria um ano um pouco melhor. Nós estamos indo para o segundo ano de seca.

Como o senhor avalia, então, o sistema de prevenção. Já alcançou eficiíªncia?

Na realidade, essa é uma das novidades que nós inauguramos nos últimos dois anos. O Cemaden e o Cenad (Centro Nacional de Gerenciamento de Riscos e Desastres) são bem recentes, do ano passado. Este sistema é fruto da decisão da presidenta de melhorar a capacidade brasileira de predição. A iniciativa polí­tica de se investir nisso é importante. í‰ uma coisa positiva. O que se busca é trabalhar antes do fení´meno ocorrer. Estamos fazendo isso. Acompanhamos tudo e as informações são passadas para os estados. Não tem surpresa. Vocíª não sabe pela televisão que vai ter uma seca. Os estados vão acompanhando, demandando, tirando dúvidas. Isso melhora muito a qualidade da assistíªncia que está sendo oferecida.

E o que vem por aí­? Fala-se de um ano dramático.

A nossa preocupação é grande. Como está se consolidando o segundo ano de seca, o ní­vel dos reservatórios do Nordeste está bem baixo. Em todos os estados está abaixo dos 40%. Em Pernambuco, está em 28%, na Bahia em 30%. Na Bahia é ainda mais crí­tico, porque não há previsão de chuva por lá. O tempo de chuva já parou. A vantagem de Pernambuco é que ainda pode chover em algumas áreas. Já está ocorrendo racionamento de água. í‰ uma realidade cada vez maior em muitas cidades. Tem água num dia e no outro não tem. Temos áreas urbanas em colapso de água. Algumas cidades estão sendo abastecidas por trem. Vamos viver um perí­odo crí­tico de julho a novembro.

O que fazer?

Temos que trabalhar até dezembro para abastecer as cidades. Foi criada a Força Nacional de Emergíªncia. Estamos visitando os estados, acompanhando o comportamento dos reservatórios e adotando polí­ticas para racionalizar o uso da água. Onde for necessário suspender irrigação, vamos suspender, onde for necessário suspender o uso da água para fins industriais ou comerciais, nós vamos suspender. Isso para garantir água para a população. Agora, dito tudo isso, não podemos ter a impressão de que o mundo se acabou. As atividades primárias nos estados do Nordeste estão se diversificando. O PIB agrí­cola de Pernambuco é 5% (do PIB do paí­s), do Ceará é 6%. Significa que a base econí´mica da região se diversificou muito nos últimos anos. A televisão gosta de colocar imagem de carroça carregando boi morto. E a gente fica com a impressão de que morreu todo o gado. Uma pesquisa feita pela USP mostra que em nenhum estado morreu mais que 10% do rebanho.

A situação não é tão grave, então?

Não estou querendo dizer que não exista prejuí­zo. O prejuí­zo é alto, R$ 16 bilhões. Não estou falando isso para minimizar. Estou falando isso porque nós não podemos entrar na onda de ressuscitar a indústria da seca. Não se pode dar ouvidos a determinadas crí­ticas feitas por setores que já estão vencidos. Isso não representa a realidade do Nordeste. Estou dando números, porque se a gente não dá números, fica só no drama.

Como o senhor disse, o prejuí­zo é grande. Quanto tempo vai levar para recuperar as perdas?

Eu fiz esta pergunta í  indústria do leite. O número é impressionante. Tem havido uma redução na produção de leite da ordem de 72%. í‰ uma pancada. Eu fiz a pergunta: se nada for feito, ou se for feito só o que já está aí­, para recompor a produção de leite do Nordeste, vai-se levar quanto tempo? E a resposta foi que vai se levar de 10 a 15 anos. Agora, se houver instrumentos de polí­ticas públicas que possam enfrentar esta situação, eles acham que em 5 ou 6 anos é possí­vel recuperar os ní­veis de produção. O setor de leite é o que leva mais tempo para se recuperar.

E tem a produção de mandioca. Também está bem afetada, não é? O quilo da farinha, que é um bem importante para o Nordeste, está custando R$ 8,00 na Bahia. Como minimizar isso?

O cultivo da mandioca é um dos grandes instrumentos de promoção de emprego e renda no Nordeste, é um arranjo produtivo importante. Nós estamos preparando um programa que vem sendo chamado de Reniva — o replantio da maniva da mandioca. A seca está tão brava, que vocíª não tem a semente da mandioca para plantar. E nós estamos desenvolvendo um programa de R$ 60 milhões com a Embrapa, em áreas irrigadas, para ter a semente da mandioca para distribuir para os pequenos produtores na próxima chuva. Para voltar í  produção de mandioca. A grande destinação é a farinha, que é um hábito alimentar dos brasileiros e, mais particularmente, do nordestino. Assim que as condições climáticas permitirem, vamos distribuir as sementes.

O governo pretende lançar um novo Plano Nacional de Desenvolvimento Regional (PNDR). Que difere este plano do anterior?

Vamos ter um novo fundo, o Fundo Nacional de Desenvolvimento Regional. Que vai se somar aos que já existem. Este tema está em discussão no Congresso, colado com os debates do FPE (Fundo de Participação do Estados), do FPM (Fundo de Participação dos Municí­pios) e do ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços). í‰ um conjunto que vai definir um novo pacto federativo entre a União, os estados e municí­pios. Os fundos vão ganhar mais força no PNDR 2. Além do fundo, estamos discutindo o instrumento de pactualização de metas e indicadores para permitir que num horizonte de dez anos nenhuma região do Brasil possa ter uma renda muito abaixo da renda média do paí­s. A presidenta Dilma estabeleceu um grupo interministerial para que em 180 dias possa instituir os instrumentos que animarão o próximo PNDR, seja através de decreto ou por meio de proposta de lei.

Falando em pacto federativo, nos últimos meses houve um acirramento das discussões em torno do pacto federativo. Os estados e municí­pios brigam entre si e cobram mais solidariedade da União. O senhor teme uma desintegração nacional?

Não. Estamos muito longe disso. Na constituinte, participei da Comissão de Finanças. Eu era o relator justamente na discussão da partilha dos recursos. Vivi este momento, que foi de muita tensão. Hoje, a grande discussão é que a estrutura de arrecadação da União está composta por impostos partilhados e não partilhados, que não era a realidade de 1988, quando se firmaram os princí­pios da federação brasileira. O que estamos discutindo é a nova partilha de recursos. E isso é sempre muito tenso.

Outra discussão tensa e que toca no pacto federativo é a MP dos portos. O governador do seu estado, Eduardo Campos, chegou a pedir a retirada do porto de Suape das novas regras. O senhor comunga desse pedido?

Suape é para Pernambuco como a Cemig é para Minas Gerais. í‰ um grande instrumento de promoção do desenvolvimento do estado. í‰ por isso que o governador pede a excepcionalização. Pernambuco viveu nos últimos oito anos uma grande transformação, que se caracteriza não só pelos fortes investimentos federais, mas sobretudo pela qualidade da infraestrutura que foi implantada. E Suape está neste contexto. í‰ de longe o melhor porto público brasileiro, pelo que foi feito ali. Pegando as declarações do governador, existe acordo em 95% da MP e o que se discute é o grau de autonomia na delegação da gestão. Porque todos os portos pertencem í  União por princí­pio federativo. O que está se discutindo é o instrumento da delegação. í‰ até onde vão os poderes da delegação. Deseja-se a delegação para ter liberdade para realizar os processos licitatórios, porque é um instrumento de atração de investimentos. Se vocíª tem o controle do processo de como fazer a ocupação do porto interno, é uma vantagem competitiva importante. Espero acreditar que possamos encontrar um entendimento sem prejuí­zo dos conceitos que todo mundo está aplaudindo.

Mas o senhor concorda com a ideia de excepcionalizar Suape?

Acho que tem que se examinar se é viável ou não. Tem que ser examinada pelo governo, pelo Congresso. Até porque o conceito que a nova polí­tica para os portos brasileiros traduz é bem- vindo. Estamos querendo garantir a menor tarifa e o maior volume de carga a ser transportada. Isso é uma urgíªncia. O paí­s está explodindo na produção agrí­cola, está crescendo cada vez mais a produção industrial. Vamos precisar cada vez importar e exportar mais. O fluxo de comércio saiu de US$ 100 bilhões para US$ 500 bilhões em dez anos. Mais de 90% disso é feito pelos portos. í‰ preciso dar esse choque para ampliar a infraestrutura portuária e modernizar. Agora, Suape é algo diferenciado do contexto dessa infraestrutura portuária brasileira.

No governo Dilma, o seu ministério teve um incremento de quase 100% para investimentos. Isso é sinal de prestí­gio?

Isso traduz o compromisso do governo com o desenvolvimento regional. Este é o ministério que tem como objetivo maior promover o equilí­brio de desenvolvimento no território nacional. E acho que o debate que nós estamos vivendo retrata a importí¢ncia do ministério e isso foi oferecido pela presidente Dilma, com orçamentos cada vez mais crescentes.

Com tantos projetos e um Plano de Desenvolvimento para tocar, o senhor pretende manter-se fiel a Dilma até o fim? Como vai ficar com uma eventual candidatura de Eduardo Campos í  Presidíªncia?

Estou muito animado pela confiança e apoio que recebo da presidente Dilma. Evidentemente ocupamos este espaço pela indicação do nosso partido, que fez parte não só na última eleição, como também na trajetória do próprio partido, nas lutas que empreendeu ao lado de Lula desde o inicio desse processo. Este é um assunto não decidido. Nós estamos criando as condições para que haja uma reflexão serena. Dá a oportunidade. Porque é legí­timo que o PSB discuta a possibilidade de liderar um projeto polí­tico, mas por outro lado é importante também que se pondere se é oportuno se tomar esta iniciativa. Enquanto tiver espaço para o diálogo e para o debate eu aposto que a gente possa continuar construindo a unidade que nos leva a estar juntos há tanto tempo num projeto comum para o Brasil, o PSB e o PT.

http://ultimosegundo.ig.com.br/politica/2013-04-08/a-seca-mostrou-que-a-estrutura-de-armazenagem-do-nordeste-ainda-e-fragil.html

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Así lo expresó Domingo Possetto, secretario de la seccional Rafaela, quien además, afirmó que a los productores «habitualmente los ignoran los gobiernos». Además, reconoció la labor de los empresarios de las firmas locales y aseguró que están «esperanzados» con la negociación entre SanCor y Adecoagro.

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