Cadeia produtiva do leite se acaba e moradores cobram ações
“A gente quer somente vidaâ€. Esse é o grito de desespero da população do Semi-írido sergipano, que há 40 anos não registrava uma seca tão intensa como a vivida nos últimos dias. A fome e sede estão deixando a marca registrada í s margens das rodovias: carcaças de animais misturam-se a uma vegetação que se alia ao sertanejo e pede socorro. A região, conhecida como a maior bacia leiteira de Sergipe, leite e derivados é o que menos se encontram nos municípios castigados. A ausíªncia de ações por parte dos governos Federal e Estadual também vem sendo sentida.
O ex-prefeito de Poço Redondo, Frei Enoque Santiago sabe bem o que os sertanejos sentem na pele e na alma, quando as chuvas teimam em não aparecer na região.
â€œí‰ a pior seca, não tem mais estrutura nenhuma. Não tem caatinga, não tem água, não tem uma política direcionada para salvar. O que a natureza tinha de sustentável, acabou. O mandacaru, que tem mais proteína, volume e é mais forte do que a palma, não tem maisâ€, lamenta Frei Enoque.
Ele ressaltou que para piorar a situação, houve corte no Programa do Leite. “Algumas coisas que minoravam como o Programa do Leite, que distribuía leite para crianças, gestantes e idosos, foi cortado há mais de ano. O pessoal víª carretas de leite saindo para as fábricas e os governantes trazendo leite de Santa Catarina. As comunidades fazem manifestação gritando que querem vida. A situação é crítica e a gente não sabe a quem recorrer. í‰ como se tudo tivesse parado no tempo. O Governo manda duas mil bolsas de 15 quilos de alimentos, quando se tem 10 mil flagelados. í‰ preciso que a Conab, que vende milho, saía de Itabaiana e venha para o sertão. Do jeito que está, está servindo aos grandes e aos fazendeiros, mas não está servindo aos pobres e aos necessitadosâ€, entende.
Leite
O prefeito de Canindé do São Francisco, Heleno Silva (PRB), que sediou semana passada o I Encontro dos Prefeitos do Semi-írido Sergipano, visando cobrar a duplicação do número de carros pipas e adutoras, além do abastecimento de água para o consumo animal, distribuição de cestas básicas, de leite e liberação de crédito rural, lamentou a crise na bacia leiteira.
“Pelo que a coisa está andando, o nosso povo vai empobrecer. A grande moeda circulante no sertão de geração de emprego e renda é o leite e a produção caiu em 50%. Temos que agir rápido para que a unidade matriz produtiva do sertão, que é a agropecuária, não entre em colapso, pois caso contrário, vamos viver dias terríveis na nossa regiãoâ€, entende Heleno Silva propondo, o quanto mais rápido possível, uma audiíªncia com o governador Marcelo Déda e até mesmo com o ministro Fernando Bezerra, da Integração Nacional.
“A maior bacia leiteira de Sergipe está reduzida a 30%. As indústrias já começam a fechar as portas e é preciso que se faça alguma coisa urgente para reverter a situaçãoâ€, complementa o prefeito de Poço Redondo, José Raimundo Araújo (PT).
Em Nossa Senhora da Glória, a produção leiteira caiu de 800 mil litros por dia para 150 mil litros diários e os produtores lamentam os prejuízos.»Antes havia uma injeção de R$ 25 milhões por míªs na economia da região. Hoje, a situação é caótica e preocupante. Ou fazemos alguma coisa, ou o Alto Sertão será a nova região citrícola de Sergipe», acredita o produtor José Erivaldo, conhecido como Neno.
O secretário de Estado da Agricultura, José Sobral explicou que somente em dezembro de 2012, foram distribuídos 440 mil litros de leite na região do Semi-írido sergipano.
“Temos 60 mil no armazém da Conab para dar continuidade. O Programa do Leite (parceria entre Governo Federal e Estadual) tem duas vertentes: a compra e a distribuição para as pessoas carentes. Não estamos encontrando oferta de leites para comprar. Estamos comprando em outras regiões para não deixar desassistida a população beneficiada. Aqui está elevado, em torno de R$ 1 o litroâ€, afirma.
Derivados
Nos municípios de Canindé do São Francisco, Poço Redondo, Monte Alegre, Nossa Senhora da Glória, Nossa Senhora Aparecida, Feira Nova, Gararu e Porto da Folha, já não se encontra queijos, requeijões, manteiga comum, manteiga de garrafa e doces por preços acessíveis.
“As pessoas reclamam dos preços, mas como os produtos estão cada vez mais difíceis, a gente já compra caro e não tem como repassar mais barato. O quilo do queijo coalho está por R$ 14 e muita gente diz que é melhor comprar na capitalâ€, afirma a comerciante de Poço Redondo Maristela Santos.
Animais
A morte dos animais vem sendo inevitável no município de Poço Redondo, um dos mais castigados pelo longo período de estiagem. Sem recursos para adquirir rações, o Sr. João Souza não teve outra opção a não ser vender o gado, como fez questão de ressaltar: ‘por nada’.
“Até essas alturas, nunca teve uma seca como essa. A terra não molhou mais do que um dedo. As palmas viram umas correias por causa do sol escaldante. Eu vendi o gado por nada e não recebi nada ainda. Tinha 18 cabeças de gado e já vendi 18 para não ver os bichinhos morre, sem eu poder fazer nada. O saco de ração está por mais de R$ 15. Aqui na Barra da Onça, a notícia que corre é que a presidente Dilma mandou um dinheiro para socorrer o gado, mas até agora nadaâ€, reclama.
“A situação é gritante. Não tem mais ração para os animais e água só em alguns pontos. Ninguém consegue créditos para as sementes, uma situação insustentável. O pessoal está salvando alguns animais, dando xique-xique, faxeiro e macambira. As fábricas de laticínio já começaram a fechar as portas, porque não existe mais a cadeia produtiva do leiteâ€, acrescenta Edicler da Silva Santos (Associação Moradores Barra da Onça).
O secretário de Estado da Agricultura confirmou uma reunião do Comitíª Integrado de Convivíªncia com a Seca com prefeitos das regiões castigadas e secretários, para essa semana. O objetivo é discutir as ações emergenciais em andamento, as que serão ampliadas tendo em vista as previsões climáticas para 2013 e as ações estruturantes,com destaque para cadastramento de Garantia Safra, do Bolsa-Estiagem, distribuição de cestas básicas e alimentos da Conab.
Por Aldaci de Souza
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