Cerco total à saúde do úbere

A mastite é a principal preocupação do produtor, mas não deve ser a única
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A mastite é a principal preocupação do produtor, mas não deve ser a única
A mastite é a maior inimiga do produtor de leite, mas não é só ela que preocupa quando o assunto é saúde do úbere. Outras doenças têm o potencial de afetar a produção. “Cistos, lesões e edemas, por exemplo, podem levar à perda de tecido especializado na produção de leite, ou até do quarto mamário”, afirma o veterinário e consultor comercial da empresa fabricante de equipamentos para o setor leiteiro Sulinox, Lissandro Stefanello.

Entre as doenças as quais o produtor deve ficar atento está a papilomatose. Também conhecida como verrugose ou figueira, essa doença infectocontagiosa é causada pelo papilomavírus bovino (BPV) e se caracteriza por lesões na pele. Conforme a pesquisadora da Embrapa Gado de Leite Vânia Maria de Oliveira, quando o úbere e/ou tetos de novilhas ou vacas são afetados pelos papilomas, as perdas por infecções secundárias, principalmente a mastite, são significativas. Além disso, a doença dificulta a ordenha e também a amamentação.

Já a varíola é uma doença infectocontagiosa que se caracteriza por lesões cutâneas em vacas lactantes e bezerros. Vânia explica que as lesões se mostram bastante resistentes, mesmo quando já estão secas. Em vacas lactantes as lesões estão principalmente nos tetos e eventualmente no úbere. Já nas bezerras são verificadas na boca, no focinho e na gengiva.
Segundo a pesquisadora, a pseudovaríola é mais frequente do que a varíola propriamente dita e também é provocada por um vírus. A doença causa lesões nos tetos dos bovinos e mais raramente no úbere. As lesões se caracterizam por bolhas doloridas, com edemas, progredindo para eritema (uma espécie de inflamação na pele), que afeta principalmente os tetos de animais em lactação, podendo também atingir o úbere e a boca.
Já a estefanofilariose é causada por um nematoide do gênero Stephanofilaria, responsável por lesões nos bovinos ao redor do olho, na papada, nos ombros, na parte ventral do abdômen e no úbere. Ocorre mais durante períodos chuvosos, tendo como vetor a mosca-dos-chifres.

O manejo inadequado durante a fase de bezerra também pode fazer com que muitas novilhas percam um ou mais quartos mamários, explica a pesquisadora da Embrapa Vânia. “Nesta fase alguns animais têm por hábito mamar uns nos outros, seja em razão do pequeno espaço que às vezes ocupam ou pela proximidade dos bezerros nessas instalações. Este hábito, porém, pode causar danos irreversíveis à glândula mamária, como, por exemplo, destruição de parte interna da glândula, com redução da capacidade produtiva do animal.” Conforme a pesquisadora, alguns animais já têm este hábito na fase de bezerra e outros o adquirem imediatamente após o desmame.

O excesso de animais em um mesmo espaço também pode causar danos ao úbere, como ferimentos provenientes de pisoteio, cerca de arames e objetos pontiagudos. Outra lesão comum em animais de produção são rachaduras decorrentes do uso inadequado de desinfetantes cáusticos e também pelo frio excessivo.

As lesões nos tetos causadas por equipamentos de ordenha mal regulados, sub-ordenha, ordenhadores, força excessiva na manipulação de tetos e remoção das teteiras sem desligar o vácuo podem gerar uma reação chamada hiperqueratose, que deixa a pele espessa, e prejudica o fechamento do canal dos tetos. Em condições normais, o esfíncter permanece aberto entre 40 minutos e uma hora após a ordenha, razão pela qual se recomenda alimentar os animais após a ordenha, para que permaneçam em pé até o fechamento do esfíncter. Se os tetos estiverem lesionados, esse período aumenta, favorecendo a entrada de bactérias no canal do teto.

Prevenir essas doenças passa por adotar medidas para impedir que micro-organismos (germes como fungos e bactérias) contaminem a superfície dos tetos, prejudicando o leite e a saúde dos animais. Manter esses agentes infecciosos longe das vacas depende de deixar em dia a higiene das instalações e também durante a ordenha.

No caso das instalações, tanto a sala de ordenha quanto galpões ou estábulos devem ser arejados, com boa claridade, e possuir pisos que favoreçam uma boa limpeza, evitando o acúmulo de esterco nestes locais e a presença de moscas.

A manutenção de ordenhadeiras também é fundamental para evitar doenças. A regulagem dos equipamentos pode fazer a diferença para a saúde do úbere e a boa produção. “Se a máquina permanecer desregulada por mais de três dias há grande risco de isso afetar as vacas, que terão de ser tratadas com antibióticos. Com isso, o produtor pode perder até cinco dias de leite”, acrescenta o veterinário da Sulinox.

O cuidado deve começar pela pressão. Cada sistema tem a sua pressão indicada. Se for de balde ao pé, deve ser de 44 a 50 kpa (quilo-pascal), conforme o Conselho Brasileiro de Qualidade do Leite. Acima disso, a pressão pode agredir demasiadamente os tetos, causando edemas, inversão, problemas de formação e anéis arroxeados nos tetos.

Se for no sistema canalizado, há duas orientações: caso seja um sistema de linha média – em que todas as tubulações estão acima do dorso da vaca, a pressão deve ser de 44 a 50 kpa. Quando a tubulação estiver abaixo da linha do dorso, caso da canalização baixa, a gravidade faz a sua parte e ajuda o leite a descer. Portanto, a pressão pode ser menor, de 42 a 46 kpa.

Entre as duas opções, Stefanello salienta que a linha baixa é a mais indicada para a preservação da saúde do úbere, por exigir menos pressão. Contudo, ele reconhece que o sistema pode ser até três vezes mais caro, o que faz com que 80% dos produtores optem pelo sistema de linha média.
A pressão é regulada por uma bomba de vácuo, que produz litragem de vácuo suficiente para o número de conjuntos de ordenhadeiras que estão no sistema. A recomendação é de 110 litros por conjunto. Para cinco conjuntos, por exemplo, são necessários 550 litros de vácuo. “Um dos principais problemas na venda de ordenhadeiras hoje é que são vendidas bombas subdimensionadas para a necessidade do sistema. É uma economia que sai caro”, esclarece Stefanello. Sem a pressão necessária, as teteiras caem e, se colocadas de volta sem serem limpas, podem contaminar os tetos com sujeira. Além disso, se a bomba de vácuo estiver desregulada, muito leite deixa de ser coletado, o que pode gerar inflamações.

“Se o nível de vácuo for inferior ao recomendado, o animal fica mais tempo na ordenha do que o necessário. Esse excesso de exposição causa stress, dor e machuca os animais, podendo levar a um prolapso de esfíncter (quando o anel muscular que controla a saída de leite fica para fora do teto), deixando o local suscetível à entrada de bactérias. Já se o nível for maior do que o recomendado, causa dor ao animal e a liberação do leite não ocorre com facilidade”, explica o gerente de equipamentos de ordenha com automação João Alves Salgado Neto, da DeLaval, outra fabricante de equipamentos para leite.

O pulsador também precisa estar bem regulado. É ele que gera a “batida” para fazer com que a teteira aperte e relaxe o teto. “Muitas vezes o produtor acha que, acelerando o pulsador, vai tirar mais leite, mas só vai machucar a vaca”, garante Stefanello, da Sulinox. Por outro lado, se o pulsador estiver desacelerado, a vaca ficará exposta à pressão por muito tempo, quando o ideal é que cada ordenha leve entre cinco e oito minutos.

A troca periódica de peças também é importante para o bom funcionamento da ordenhadeira. As teteiras devem ser trocadas após 2.500 ordenhas ou a cada seis meses, o que chegar primeiro. Caso sejam de silicone, o período dobra para 5.000 ordenhas. “Se a troca não for feita no tempo certo, a borracha da teteira perde a elasticidade, o que causa falhas na massagem e vai provocar machucados ou não retirar o leite”, alerta Stefanello.

Um sinal comum de que há problemas na ordenhadeira é a formação de um anel arroxeado no teto. “Isso indica a sub-ordenha ou a sobreordenha”, diz Salgado Neto. A primeira ocorre quando o ordenhador interrompe o processo de ordenha antes de ele estar completo e, a segunda, quando o conjunto de ordenha da vaca fica mais tempo do que o necessário ligado à vaca e o leite já foi todo extraído. A regra para a troca das mangueiras de leite é a mesma: seis meses. Com o uso, ocorre a formação de sedimentos que podem contaminar o leite.

A limpeza do equipamento também merece destaque. “O leite é rico em gordura e proteína, um substrato ideal para bactérias”, diz Salgado Neto. Ele orienta os produtores a verificar a limpeza de componentes, como o copo coletor, por exemplo, que pode ser identificada pela análise visual. “Ele precisa ser tão limpo quanto um copo d’água que bebemos em casa. Se houver um aspecto viscoso ou uma camada seca de sedimentos, precisa ser limpo”, recomenda.

Para Salgado Neto, a manutenção preventiva é de extrema importância. “Muitas vezes, existem pequenas ineficiências que só o técnico consegue identificar. Há resistência dos produtores quanto a isso, mas uma manutenção emergencial é muito mais cara”, garante.

Antes da ordenha, é preciso limpar os tetos, mas sem limpar o úbere todo, ressalta Stefanello. A limpeza pode ser feita tanto com água quanto com clorexidina. Depois da limpeza, os tetos devem ser enxutos com um papel toalha individual para cada teto. “Ordenhar as vacas com tetos sujos e úmidos, além de ser uma das principais causas de contaminação do leite, provoca o aparecimento de mastite nas vacas em lactação”, pondera Vânia, da Embrapa. Depois da ordenha, a alimentação das vacas é recomendada para que elas se mantenham em pé e o teto possa fechar, evitando a entrada de bactérias. Também deve ser usado ácido lático ou iodo cosmético para este mesmo fim.

Mastite afeta a maioria dos rebanhos

As doenças descritas também podem abrir as portas para a mastite, que ainda é o principal motivo de descarte entre vacas leiteiras e causa perdas de 30% a 40% da renda do produtor e afeta, em média, 30% do rebanho nacional. A forma subclínica da mastite, que pode ser até 40 vezes mais frequente do que a forma clínica, causa as maiores perdas econômicas e a redução da produção de leite por rebanho pode chegar a 71%.
«A doença tem uma prevalência bastante alta e há espaço para redução. Para isso, é necessário adotar um programa de controle», diz o professor da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da USP e presidente do Conselho Brasileiro de Qualidade do Leite (CBQL), Marcos Veiga, colunista de Mundo do Leite. Ele salienta que, por ter diferentes agentes causadores e pela produção se dar em condições diversas em cada propriedade, não é possível indicar um meio universal de lidar com a doença.
«Isso ocorre principalmente em função das distintas realidades relacionadas aos sistemas de produção; à produção e genética dos rebanhos e à condição social, econômica e cultural dos produtores», salienta a pesquisadora da Embrapa Gado de Leite, Vânia Maria de Oliveira. Mas é fundamental que o produtor tenha meios para diagnosticar a doença. Para auxiliar nessa tarefa, a Embrapa Gado de Leite deve lançar em julho cartilhas que orientam os produtores a fazer o diagnóstico e o tratamento da doença.
Veiga explica que o CMT (California mastitis test) é uma forma simples de diagnosticar a doença e que os produtores devem lançar mão do exame. Depois da limpeza dos tetos, os primeiros três jatos de leite de cada teto devem ser tirados, para estimular a produção de ocitocina e também realizar o exame para mastite. Esse leite é colocado em um recipiente com reagente e, se apresentar aspecto gelatinoso, indica que há problemas. «O ideal é que seja feito todo dia, no mínimo duas vezes, para que se tenha um controle da saúde dos animais. Outra maneira de se fazer esse controle é ter um protocolo estabelecendo quando o exame será feito», afirma Paulo Fernando Machado, diretor da Clínica do Leite da Esalq/USP. «Muitos produtores não fazem o exame porque estão preocupados com reprodução, custo de alimentação e preço do leite, por exemplo, e não dão prioridade a este problema», acrescenta.

Há também o teste da caneca telada ou de fundo escuro, que consiste na eliminação dos três primeiros jatos de leite em uma caneca com fundo escuro e permite a detecção do leite visivelmente alterado. «Muitas vezes o produtor não faz o CMT nem o teste da caneca, e quando identifica o problema já é tarde demais», acrescenta Vânia. Como boa parte das propriedades não faz esses exames de rotina, a contagem de células somáticas do tanque de refrigeração é a informação mais utilizada para identificar casos de mastite.
Para Vânia, porém, não apenas a falta de diagnóstico, mas o tratamento das vacas infectadas, constitui um grande problema da pecuária leiteira. Ela alerta para a possibilidade de desenvolvimento de resistência em bactérias que causam doenças. «Isso ocorre quando os antibióticos são utilizados de forma inadequada, como sem prescrição médica ou por períodos de tempo insuficiente, o que pode levar à seleção de linhagens de bactérias resistentes, dificultando a cura de várias infecções.»

Doença pode se manifestar de forma clínica ou subclínica

A mastite é uma inflamação da glândula mamária que pode surgir na forma clínica _ em que os animais apresentam sinais clínicos como secreção de leite com grumos, pus ou aspecto aquoso, tetos e úberes com vermelhidão, edema e áreas endurecidas _, ou subclínica, ou seja, sem alterações visíveis no leite e no úbere. Há outros sintomas, como febre, perda de apetite e úberes quentes e doloridos. Em mais de 95% dos casos, a mastite tem como causa uma infecção bacteriana, causada por Streptococcus agalactiae, S. aureus, S. dysgalactiae, S. uberis e Escheria coli. O resultado dessa infecção é a destruição das células epiteliais, responsáveis pela síntese dos principais componentes do leite (proteína, gordura e lactose), explicam José Reinaldo Brito e José de Oliveira Sales, no artigo Saúde do úbere: uma revisão, publicado na «Revista Brasileira de Higiene e Sanidade Animal» em 2007. Há dois tipos de mastite: a ambiental, na qual a vaca é contaminada por um agente encontrado no ambiente da fazenda (água, fezes, materiais usados como cama, pele dos animais e úbere); e a contagiosa, que é transmitida entre as vacas e que não tem cura. A contaminação ocorre entre animais ou quando visitantes trazem a doença. Caminhões de coleta, por exemplo, podem ser vetores da doença, pois transitam em diversas propriedades e podem trazer as bactérias de uma propriedade para outra. A disseminação dos micro-organismos contagiosos no rebanho ocorre sobretudo na ordenha, através de equipamentos contaminados ou pelas mãos de ordenhadores. No caso da mastite ambiental, geralmente a bactéria fica no piso da sala de ordenha ou da sala de espera. Higienizando o ambiente em que a vaca se encontra, geralmente o problema se resolve.

http://www.portaldbo.com.br/Mundo-do-Leite/Noticias/Cerco-total-a-saude-do-ubere/14990

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Así lo expresó Domingo Possetto, secretario de la seccional Rafaela, quien además, afirmó que a los productores «habitualmente los ignoran los gobiernos». Además, reconoció la labor de los empresarios de las firmas locales y aseguró que están «esperanzados» con la negociación entre SanCor y Adecoagro.

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