#Fusões e aquisições, novos investimentos e estratégias no setor de lácteos

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Por Benoit Rouyer – Chefe de Serviços Econômicos na organização CNIEL (Centro Nacional Interprofissional de Economia Leiteira)

 

Antes de analisar as diferentes operações realizadas pelos líderes do setor de lácteos, é importante ter em mente alguns direcionadores de nosso ambiente econômico. Uma de suas principais características não diz respeito somente ao setor de lácteos, mas ao mercado global de alimentos. A maioria dos analistas considera que o equilíbrio de longo prazo entre oferta e demanda de alimentos é acima de tudo um desafio em termos de recursos. A principal questão é como alimentar 2,4 bilhões de pessoas a mais esperadas no planeta até 2050, de acordo com as Nações Unidas. A equação é especialmente difícil de resolver uma vez que as mudanças climáticas e a exaustão dos recursos não deverão permitir saltos na produtividade registrados durante as últimas décadas. O Banco Mundial ainda considera que os rendimentos agrícolas cairão na maioria dos países em 2050, considerando as atuais práticas agrícolas e as variedades de culturas.

 

Outro importante direcionador é a nova distribuição geográfica da demanda mundial. De acordo com a Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), o tamanho da classe média global pode crescer de 1,8 bilhão de habitantes em 2009 para 4,9 bilhões em 2030. Mais de 80% do crescimento na demanda para as duas próximas décadas deverá vir da Ásia. Como consequência, Índia e China estão progressivamente ultrapassando Estados Unidos e Europa em termos de demanda.

 

Outro fator importante diz respeito ao setor de lácteos especificamente. A maioria dos países que acredita-se que serão a nova força direcionadora da economia global apresenta um déficit líquido de produtos lácteos. De fato, a maioria dos países asiáticos e africanos são importadores líquidos e deverão permanecer assim nos próximos anos. A Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO) até prevê um aumento no déficit comercial em ambas as regiões, Ásia e África, nas próximas décadas, devido ao forte crescimento da demanda local por produtos lácteos.

 

Outro fator importante a ser levado em consideração é o tipo de produto importado pelos países emergentes. Conforme ilustrado pelos países do BRIC (Brasil, Rússia, Índia e China), as principais importações são de produtos lácteos desidratados, como leite e soro de leite em pó.

 

Finalmente, os fornecedores de alimentos, incluindo os produtores e os processadores de leite sofrem uma alta pressão descendente em sua margem, especialmente nos países desenvolvidos, à medida que a participação do orçamento familiar dedicado aos gastos com alimentos vem decrescendo continuamente nos últimos anos. Os gastos com alimentos é claramente uma fonte de economia para muitas famílias que buscam financiar seus crescentes gastos com lazer, smartphones ou televisões de tela plana.

 

Esses cinco direcionadores fornecem indicações claras aos operações de lácteos e também aos operadores de outros setores sobre a orientação de seus negócios. A primeira indicação, é que o leite, como um alimento em geral, se tornará mais valioso, ou espera-se que isso aconteça na maior parte do mundo nos próximos anos. Como consequência, o setor de lácteos atrai pessoas novas, recém-chegadas, tanto em nível de fazenda, como em nível de processamento. Além disso, os processadores de lácteos implementam estratégias visando garantir seu abastecimento. Por último, mas não menos importante, nenhuma bacia leiteira é negligenciada. Como veremos mais tarde com mais detalhes, os investimentos no setor de lácteos são realizados em todo o mundo. Segunda indicação: a demanda mundial está cada vez mais focada nos países emergentes. Como consequência, os líderes do setor de lácteos ocidental investem massivamente nos países emergentes, onde ao mesmo tempo, novos líderes nacionais crescem rapidamente e investem também no exterior. Terceira indicação: a demanda por produtos lácteos desidratados está aumentando rapidamente. Consequentemente, fortes investimentos e novas secadoras foram construídas nos últimos anos. Quarta indicação: que não é uma revelação, mas uma limitação bem estabelecida que está se tornando cada vez mais persistente, é que o processamento de alimentos básicos tem uma lucratividade muito baixa em economias desenvolvidas. Essa indicação tem várias consequências para os processadores de lácteos. Além do crescente interesse em exportar aos países emergentes, especialmente com produtos lácteos desidratados, muitos investimentos estão sendo feitos para aumentar o tamanho das fábricas de lácteos.

 

Os recém-chegados vêm de vários campos, como negócios de refrigerantes ou comércio. Pepsico é definitivamente a recém-chegada que mais investiu no setor de lácteos nos últimos anos. Em 2010, a empresa comprou a líder do setor leiteiro da Rússia, Wimm Bill Dann, por cerca de US$ 5 bilhões. Mais recentemente, em 2012, a Pepsico fez uma parceria com o grupo alemão de lácteos, Müller, visando produzir e vender iogurtes nos Estados Unidos. A Coca-Cola também está muito comprometida com o setor de lácteos, especialmente na América Latina. Há três anos, comprou uma companhia de lácteos no Panamá, que tem 3 fábricas e emprega 1.300 pessoas. No ano passado, comprou a companhia de lácteos mexicana, Santa Clara Mercantil de Pachuca por cerca de US$ 200 milhões. Finalmente, em 2012, a Coca Cola fez uma parceria nos Estados Unidos com a SelectMilk Producers para processar e vender a bebida láctea Core Power. Os recém-chegados também vêm da divisão de negócios. Um dos comerciantes mais comprometidos tem sido a Olam, de Cingapura. A Olam detém ativos na área de produção primária e de processamento de lácteos. Primeiro de tudo, em 2007, a Olam comprou ações em uma processadora neozelandesa chamada Open Country. Então, e 2010, assumiu o controle da NZ Farming Systems Uruguay, que tem várias fazendas leiteiras no Uruguai. Desde 2012, a Olam também está comprometida no setor leiteiro russo, onde comprou a Rusmolco, uma companhia envolvida no negócio de produção leiteira. Finalmente, a Olam assumiu o controle da processadora de lácteos nigeriana Kayass em 2012, por US$ 85 milhões.

 

A produção leiteira atrai investimentos pesados fornecidos por companhias registradas em bolsa ou investidores internacionais. De fato, fazendas gigantes administradas com uma abordagem capitalista estão surgindo em muitas regiões. Foi mencionado anteriormente a NZ Farming Systems Uruguay, mas esse tipo de companhia existe quase em todos os locais hoje em dia. Outros exemplos podem ser citados. Por exemplo, na Europa, podemos mencionar a TrigonAgri. Registrada na Dinamarca, listada na Suécia, a TrigonAgri tem 7 fazendas na Rússia, Ucrânia e Estônia, totalizando quase 200.000 hectares e 10.000 vacas. Na China, a ModernDairies, que é registrada na bolsa de valores de Hong Kong, tem 150.000 vacas. Na Nova Zelândia, a CrafarFarms, que tem 20.000 vacas, foi comprada em 2012 pela chinesa Shanghai Penghxin. Finalmente, na Colômbia, o New ZealanderDairySolutioNZ e o Colombian Aliar estabeleceram uma parceria, visando produzir 23 milhões de litros de leite com 50.000 vacas leiteiras na região de Puerto Gaitán em 2015.

 

A produção leiteira não atrai somente fundos de private equity. Os processadores de lácteos também estão preocupados. A esse respeito, a China é um exemplo marcante dessa estratégia implementada por processadores de lácteos. A Nestlé está investindo US$ 400 milhões em um novo instituto agrícola, que inclui mais de 10.000 vacas em três fazendas de treinamento. A Mengniu pretende gastar US$ 550 milhões até 2015 visando estabelecer 8 a 12 novas mega-fazendas. Em maio de 2013, a empresa também comprou participação de 28% na Modern Dairies, a maior produtora de leite cru na China. A Fonterra atualmente tem duas grandes fazendas, mas há três unidades adicionais que deverão ser instaladas rapidamente.

 

A lucratividade do negócio nem sempre é a motivação primária dessas medidas tomadas pelos processadores de lácteos. O controle da oferta e a qualidade do leite parecem ser muito mais importantes para Mengniu e Nestlé em um país onde os consumidores têm estado confusos nos últimos anos por causa de problemas sanitários. No caso da Fonterra, suas fazendas leiteiras chinesas fornecem a imagem de produtora local e garante que os chineses não percebem o grupo como um fornecedor de bens importados.

 

Quando se analisa a localização dos investimentos feitos no setor leiteiro, é possível detectar áreas perdedoras e áreas vencedoras? Pode-se tentar responder a essa pergunta através da análise dos investimentos feitos por uma companhia global como a Nestlé, que tem fábricas nos cinco continentes. Porém, quando se compila em um mapa todos os investimentos anunciados ou finalizados pela Nestlé nos últimos três anos, é difícil definir qualquer área perdedora. A Nestlé tem investido em quase todos os locais, mostrando que nenhuma bacia leiteira pode ser negligenciada. A obtenção de leite no mundo todo parece ser uma questão chave para uma companhia global como a Nestlé.

 

Um importante eixo da estratégia de um líder no setor de lácteos é seu crescente interesse por países emergentes. De fato, os líderes ocidentais têm massivamente investido nos últimos meses na Ásia. Arla Foods e Danone compraram ações na chinesa Mengniu, enquanto a Danone estabeleceu uma parceria com esta mesma empresa no setor de iogurtes. O grupo holandês Friesland Campina assumiu o controle da Filipino Alaska por US$ 450 milhões. Finalmente, em julho de 2012, a Danone comprou a divisão de nutrição do grupo indiano, Wockhart por US$ 240 milhões.

 

Outros exemplos podem ser citados na África. Conforme mencionado anteriormente, em 2012, a comerciante de Cingapura Olam comprou a processadora de lácteos da Nigéria, Kayass. Em Marrocos, a francesa Danone investiu US$ 740 milhões em 2012 para aumentar sua participação na La Centrale Laitière de 29% para 67%. Finalmente, a espanhola Kaiku, subsidiária do grupo suíço Emmi, comprou participação majoritária na companhia de lácteos da Tunísia, Vitalait, em 2012.

 

Paralelos a esses investimentos massivos feitos por grupos ocidentais, novos líderes nacionais estão surgindo nos países emergentes. Estimulados pela dinâmica demanda local, eles cresceram rapidamente nos últimos anos e também estão investindo no exterior. É o caso da China. De fato, a chinesa Yili multiplicou suas vendas por 9 em 9 anos. A chinesa Mengniu multiplicou suas vendas por 12 durante o mesmo período.

 

Da mesma forma, na Índia, a Gujarat Cooperative Milk Marketing Federation, que é mais conhecida por sua marca principal, a Amul, acelerou seu crescimento durante a última década. Suas vendas se multiplicaram por quatro dentro de oito anos, enquanto seu crescimento anteriormente era muito pequeno.

 

A internacionalização industrial não é mais uma prerrogativa dos grupos ocidentais apenas. Várias companhias de lácteos da América Latina recentemente investiram nos Estados Unidos. Como exemplo, em 2009, a Lala se tornou a número dois no mercado de leite fluido nos Estados Unidos. Em um único ano, a Lala comprou 20 fábricas, incluindo 18 da National Dairy. Mais recentemente, em 2012, a colombiana Alpina abriu uma fábrica de iogurtes próximo a Nova York.

 

A internacionalização é também de interesse das líderes do setor de lácteos da Ásia. Em 2010, a chinesa Bright Dairy assumiu o controle da neozelandesa, Synlait. Depois, em 2013, ambos os grupos chineses, Yili e Yashili, investiram na construção de plantas de fórmulas infantis na Nova Zelândia. Em 2010, a companhia do Vietnã, Vinamilk, também se estabeleceu na Nova Zelândia, assumindo uma participação na Miraka, uma nova operadora de lácteos.

 

Combinando uma maior população e um crescimento na renda, os países emergentes, especialmente na Ásia, são claramente comércios com alto potencial de crescimento para o consumo de lácteos nos próximos anos e um espaço enorme para produtos desidratados, que representam o centro de suas importações de produtos lácteos. Essa falta de ambiguidade quando se define mercados com alto potencial de crescimento leva as estratégias da companhias a convergirem em metas similares. Dessa forma, o risco de mimetismo em termos de investimentos parece ser bastante elevado.

 

Para ilustrar esse risco, tentei compilar todos os investimentos anunciados ou finalizados em 2012 e começo de 2013 referentes a produtos lácteos desidratados em diferentes partes do mundo. Mesmo se percebermos isso somente como a ponta do iceberg, a quantidade global investida no processamento de produtos lácteos desidratados é muito impressionante: cerca de US$ 4,7 bilhões durante os últimos 20 meses. São 75 projetos em 22 países envolvidos, com participação de 65 companhias.

 

Esses investimentos estão principalmente concentrados em três continentes: primeiro de tudo, Oceania, onde os produtos desidratados têm liderado as exportações de lácteos nas duas últimas décadas; segundo, América, onde os produtos lácteos desidratados apresentam um interesse para o mercado doméstico e de exportação; finalmente, Europa, onde fortes investimentos em secadoras representam uma nova tendência. Há alguns anos, as companhias europeias costumavam investir principalmente em produtos para o mercado doméstico, como iogurte, leite fluido e queijos. Essa nova tendência de investimentos mostra a confiança que várias companhias europeias estão colocando em sua capacidade de vender de forma duradoura leite em pó ao mercado mundial. De fato, elas consideram que instalar secadoras é a melhor forma de processar os volumes adicionais de leite que esperam em 2015, após a abolição das cotas de produção de leite.

 

Na Oceania, 7 projetos excedendo US$ 50 milhões cada foram recentemente anunciados ou finalizados. Três projetos envolvem a Fonterra. Uma nova secadora começou a funcionar em agosto de 2012 na planta de Darfield, localizada na Ilha do Sul. Uma nova no mesmo lugar, com capacidade maior, deverá entrar em funcionamento em breve. Finalmente, a Fonterra também anunciou a construção de uma nova secadora em Pahiatua, Ilha do Norte. Ao mesmo tempo, vários investimentos estão sendo feitos por companhias chinesas (Yili e Yashili, que já foram mencionadas) e também por companhias locais menores, como Synlait e NZ Dairy Goat.

 

Na América, 10 projetos excedendo US$ 50 milhões foram identificados. Quatro deles estão sendo realizados nos Estados Unidos pela Agropur, Cayuga Marketing, DFA e Southwest Cheese. Seis deles estão sendo feitos na América Latina: um no Brasil, referente à sociedade entre Carbery e Brasil Foods, um no Chile com a Nestlé, dois no Uruguai, com Conaprole e Estancias del Lato, e finalmente, dois na Argentina, envolvendo a SanCor, um realizado com somente essa empresa na fábrica localizada em Sunchales e outro em parceria com a Mead Johnson, na divisão de fórmulas infantis.

 

Na Europa, 18 projetos excedendo US$ 50 milhões foram identificados. A maioria deles está localizada na Europa Ocidental, em regiões dinâmicas esperando mais leite após 2015: cinco estão sendo feitos na Alemanha, três na Holanda, três na Irlanda, três na França, dois na Dinamarca, um no Reino Unido e um na Finlândia. É interessante notar que dois dos três projetos na França envolvem investidores chineses; a cooperativa de lácteos francesa Isigny Sainte Mère se uniu com a chinesa Biostime, enquanto a cooperativa francesa Sodiaal fez uma parceria com a chinesa Synutra.

 

A competição acirrada entre os processadores de lácteos, mas também, a alta pressão sobre as margens pelos varejistas e consumidores continuamente estimulam a busca por economias de escala. Como consequência, as referências para definir uma grande fábrica são muito maiores do que eram há alguns anos. Para o leite fluido, um novo recorde será estabelecido nos próximos meses pela Arla Foods, com uma fábrica localizada no Reino Unido capaz de embalar 1 bilhão de litros de leite pasteurizado por ano. Com relação aos queijos, o tamanho de uma grande fábrica atualmente vai de 100.000 a 150.000 toneladas por ano. Essas fábricas têm sido relativamente comuns nos Estados Unidos por pelo menos uma década. Entre as companhias envolvidas, Leprino, Hilmar Cheese e Glanbia, podem ser citadas. Na Europa, essas fábricas são novas. Porém, várias companhias já alcançaram esses níveis ou o farão em breve. Esse é notavelmente o caso dos grupos holandeses Friesland Campina e DocKaas, ou da cooperativa alemã, DMK e Ammerland. Assim como para o leite em pó, as maiores fábricas estão localizadas na Nova Zelândia, onde a Fonterra tem vários locais produzindo mais de 200.000 toneladas anualmente.

 

 

 

http://www.milkpoint.com.br/cadeia-do-leite/artigos-especiais/fusoes-e-aquisicoes-novos-investimentos-e-estrategias-no-setor-de-lacteos-86341n.aspx

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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Así lo expresó Domingo Possetto, secretario de la seccional Rafaela, quien además, afirmó que a los productores «habitualmente los ignoran los gobiernos». Además, reconoció la labor de los empresarios de las firmas locales y aseguró que están «esperanzados» con la negociación entre SanCor y Adecoagro.

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