Entenda como, em apenas três anos, os irmãos Cotrim Rodriguez criaram uma marca de queijo de búfalas desejada nos principais restaurantes e centros gastronômicos do Brasil
O desempenho financeiro dessa guinada nos negócios vem mostrando que eles estavam certos. No ano passado, o grupo, que agora se chamaTuttolatte, faturou R$ 16 milhões. Para este ano, a meta é ousada: eles querem crescer 25% e fechar a receita na casa dos R$ 20 milhões. Os irmãos são herdeiros do executivo Magim Rodriguez Júnior, que começou a criar gado nos anos 2000 e que hoje é conselheiro na Tuttolatte Magim foi protagonista de um dos capítulos mais ricos da história corporativa brasileira, a integração das operações de Brahma e Antarctica nos anos 2000 para o surgimento da AmBev. “A quantidade de queijo que vendemos hoje quase a mesma de quando adquirirmos a propriedade. Mas o faturamento quase dobrou”, diz Ricardo. “Nossa estratégia é estar onde há pessoas dispostas a pagar por qualidade.”
O negócio dos Rodriguez vem dando certo, também, porque há três décadas a fazenda Búfalo Dourado já era uma propriedade de peso no mercado de bubalinos. Wilma Penteado Ferreira, criadora e antiga proprietária da marca, está entre as pioneiras em produção de mozzarella de búfala no Brasil.
Mas, para alavancar o projeto de queijo de búfalas, os irmãos se prepararam. Em 2014, eles foram à Itália para conhecer o processo de fabricação da mozzarella, um dos mais tradicionais queijos do país, que faz sucesso em todo o mundo. Isso porque, embora já acessassem mercados diferenciados para os produtos Búfalo Dourado, como a Casa Santa Luzia e o Empório Santa Maria, na capital paulista, além de redes como Pão de Açúcar, Saint Marche, Oba Hortifruti, Mambo e algumas lojas do hipermercado Extra, os irmãos Rodriguez queriam mais. “Fomos à Itália aprender a receita tradicional da mozzarella, para criar um produto exclusivo para o Eataly, um passo importante nessa nova caminhada”, diz Ricardo. “Isso elevou ainda mais a qualidade dos queijos, que já era bastante artesanal.” O Eataly, inaugurado em maio de 2015 em São Paulo, é um super complexo gastronômico com sete restaurantes temáticos e uma oferta de cerca sete mil itens nacionais e importados, entre carnes, frutas e legumes, laticínios, massas, entre outros. Originado em Turim, na Itália, em 2007, a rede tem 35 lojas em cidades como Nova York, Tóquio, Paris, Roma, Dubai, destinadas a um público de poder de compra elevado.
No Eataly, os irmãos montaram um mini laticínio, onde parte da mozzarella vendida ou utilizada nos restaurantes é fabricada diariamente no local. Para isso, eles criaram a marca exclusiva Tuttolatte, que foi incorporada como o atual nome do grupo. O ano de 2016 foi o primeiro ciclo fechado de vendas nessa casa, de produtos entre a mozzarella e as suas variações, como a stracciatella, por exemplo, um tipo de queijo cremoso da região de Puglia. No mês passado, um quilo da mozzarella tradicional custava R$ 78.
Para incentivar o aumento do consumo, as estratégias têm sido
diversas. Elas passam por promoções, como a realizada em fevereiro, chamada de “O mês da mozzarella” no Eataly, com descontos de 20%, a planos mais ousados. Até o final deste ano, os Rodriguez vão inaugurar nas dependências do Eataly o primeiro Mozzarella Bar, também em parceria com a casa. “Este será apenas o primeiro”, diz Fábio. “A idéia é ter novas unidades como esta que abriremos.” Aliás, a viagem à Itália e a parceria com o empório, a principal vitrine para a venda da mozzarella, foi um divisor de águas para os negócios do grupo Tuttolatte. Os produtos com a marca Búfalo Dourado foram reposicionados nos pontos de vendas onde já atuava, além de conquistar novos parceiros, como a rede de hotéis Unique e o Emiliano, e com empresários da alta gastronomia paulista, como Marcelo Fernandes, 59 anos, sócio de casas badaladas, entre elas o espanhol Clos e o japonês Kinoshita onde o queijo faz parte do cardápio.
CONSUMO No Brasil, o consumo de queijos finos é um segmento em alta e a Tuttolatte está na corrida por uma fatia desse mercado. De acordo com a Associação Brasileira das Indústrias de Queijo (Abiq), nos últimos cinco anos, a produção de queijos de todos os tipos de leite saltou de 900 mil toneladas para 1,1 milhão de toneladas em 2016. O consumo per capita anual saiu de 3,9 quilos para 5,6 quilos, para um mercado estimado em R$ 20 bilhões. Os queijos finos, que respondiam por até 5%, passaram a 6,5% do mercado, equivalente a cerca de 71,5 mil toneladas.
Para Otávio Bernardes, que também é criador de búfalos e vice presidente de marketing da Associação Brasileira de Criadores de Bubalinos (ABCB), o mercado de queijo de búfalas é crescente e deve permanecer em alta nos próximos anos. “O número de animais leiteiros vem crescendo em torno de 20% ao ano”, afirma Bernardes. Hoje, o rebanho é de 25 mil animais leiteiros, para um rebanho nacional de 1,6 milhão de búfalos. Desde o ano 2000, a entidade possui um selo de qualidade, o Selo de Pureza 100% Búfalo, aprovado pelo Ministério da Agricultura para indicar ao consumidor os produtos que levam na sua composição apena o leite dessa espécie de animal.
Na fazenda Búfalo Dourado, ao assumir o rebanho, a primeira providência dos irmãos foi iniciar a mudança do padrão genético dos animais, que eram das raças murrah, mediterrâneo e jafarabadi. Eles passaram a concentrar o trabalho de reprodução em uma única raça bubalina, a mediterrâneo, que é a mesma criada na Itália. Também iniciaram a importação de sêmen desse país e hoje 900 animais, 90% do rebanho, já têm linhagens italianas no sangue. “A produtividade disparou e a qualidade do leite melhorou muito”, afirma Ricardo. “Conseguimos características de gordura e proteína perfeitas para a elaboração da mozzarella.” A média de produção das 400 bufálas em lactação passou de seis litros diários para dez litros, um incremento de 66% e acima da média nacional, de sete litros diários por fêmea.
A tecnologia também passou a fazer parte da lida. Enquanto a maioria dos rebanhos utiliza a monta natural, a Búfalo Dourado aposta na técnica da Inseminação Artificial em Tempo Fixo (IATF), para dar ritmo ao trabalho de reprodução, e à Fertilização in Vitro (FIV) para acelerar o aumento da melhor genética. “Com essas ferramentas resolvemos o problema de sazonalidade do leite e conseguimos manter um fornecimento estável durante todo o ano”, afirma Fábio. As mudanças também abriram um novo mercado, como fornecedores de genética. No ano passado foram vendidos, por R$ 2,4 milhões, 600 animais que são recriados na fazenda Sesmaria. Para 2017, a meta é vender 300 animais. Agora, eles são referência na região. “Os criadores gostam do animal que produzimos e de seu leite”, diz Fábio. “Somos referência em genética e também no manejo de búfalos.”