Produtores de leite que trabalham com regime de pastejo devem dedicar atenção especial à alimentação das vacas no período de transição, que ocorre entre o final da seca e o início das águas, a partir de meados de setembro.
O cuidado é necessário porque os animais que passaram a época de estiagem sendo alimentados com volumoso conservado no cocho poderão voltar a pastejar, desde que não haja evento climático que comprometa o volume e a frequência das chuvas, atrapalhando o crescimento do pasto.
“Se tudo correr normalmente, a partir de outubro começa a haver disponibilidade de pasto. No primeiro momento, porém, ele não será suficiente para alimentar todo o rebanho, porque os brotos surgem com o início das chuvas, mas demora um tempo para chegar ao potencial máximo de produção”, afirma o PhD em nutrição de ruminantes, Alexandre Pedroso.
O especialista recomenda que o produtor faça escalonamento do rebanho. “Primeiro, ele deve colocar para pastejar categorias menos exigentes, mantendo a alimentação das vacas de produção com volumoso conservado. À medida que aumenta a disponibilidade de pasto, ele vai fazendo a transição da dieta.”
Pedroso ressalta que o pasto tem composição nutricional diferente do volumoso conservado, que normalmente é feito de silagem de milho, de sorgo, ou cana-de-açúcar. “Nesse período, a dieta das vacas muda bastante e é preciso fazer a readequação. Um pasto de alta qualidade tem níveis mais elevados de proteína na comparação com o volumoso conservado, por isso, é preciso introduzir concentrados, que podem ser feitos na fazenda ou comprados prontos. Dessa forma, ele poderá manter as características nutricionais da dieta.”

Deslocamento

Outra observação importante, segundo ele, é que sempre que as vacas deixam o confinamento e vão para o pasto, os requerimentos para mantença aumentam em função do maior deslocamento dos animais. “A necessidade energética aumenta quando a vaca está em pastejo, sendo muito comum ocorrer queda de produção nesse período de transição. Por isso, é necessário fazer o ajuste na dieta, para que o impacto seja o menor possível.”
Segundo ele, eventualmente, se acabar o estoque de volumoso concentrado e não houver pasto e, além disso, o produtor não conseguir comprar volumoso, a solução é oferecer mais concentrado. “Certamente o produtor vai precisar do apoio de um nutricionista para ajustar a dieta com baixíssima inclusão de volumoso. Isso é muito ruim, mas é um cenário que pode acontecer e tornar a dieta cara e menos saudável. Por isso, o produtor tem de fazer de tudo para não ficar sem volumoso conservado.”
Conforme o especialista, para fazer o ajuste da dieta o produtor sempre deve contar com a ajuda de um técnico. “Esse profissional tem conhecimento para entender qual é a qualidade do pasto e quais os alimentos disponíveis nos concentrados disponíveis na fazenda. Somente assim é possível obter o balanceamento adequado.”
Pedroso reforça a importância de que o produtor tenha em mente o fato de que não é possível controlar o clima. “Para crescer, o pasto precisa de chuva, luz e calor. Por isso, o produtor tem de estar preparado para lidar com adversidades climáticas, tendo volumoso conservado suficiente para suprir um possível atraso das águas, afinal, prevenir é melhor que remediar.”
Coordenador do Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (Senar-RJ), Mauricio Salles reforça a recomendação. “O planejamento dos produtores deve ter boa folga para o volumoso do cocho. Se o período de seca é de 120 dias, o volumoso deve ser suficiente para 150 dias ou mais. É sempre bom haver sobra.”
Segundo ele, se a pastagem for de boa qualidade será preciso apenas fazer o balanceamento da dieta para que não ocorra perda de produtividade. “O técnico que acompanha a propriedade tem de avaliar o nível de nutrientes que o volumoso conservado está proporcionando e ir balanceando a dieta para suprir as necessidades do rebanho.”
Pesquisador da área de produção animal e conservação de forragens da Embrapa, André Novo avalia que o impacto na produção de leite depende da pastagem em que o gado irá entrar e de qual volumoso ele estará saindo, porque a pastagem bem manejada costuma ter melhor qualidade. “Mas se a pastagem não for suficiente, será preciso continuar com a suplementação feita com alimento concentrado, de acordo com a estimativa de qualidade do pasto.”

Solo

Novo recomenda que antes do início das chuvas o produtor avalie as condições do solo, porque pode ser necessário corrigir o pH. “Nesse caso, a calagem tem de ser feita antes do início das chuvas. Além disso, se o produtor faz manejo mais intensivo da área, a análise do solo também servirá para definir como será feita a adubação da pastagem no período das águas.”
O pesquisador diz que se o pasto tiver resíduos de capins da família Panicum, será preciso fazer uma roçada antes das águas. “Esse capim fica muito alto e seco, a roçada é importante para deixar a área uniforme. É bom eliminar esse material que já está muito passado e que se não foi comido pelos animais é porque deve estar com qualidade muito baixa.”
Salles acrescenta que essa transição costuma ser mais tranquila para quem trabalha com irrigação de pastagem, porque mesmo na estiagem pode dar pasto ao rebanho, intercalado com volumoso.
“A irrigação tem facilitado a vida do produtor no período de transição. Muitos mantêm o primeiro lote da propriedade sendo alimentado com pasto, mesmo na entressafra, sem a necessidade de oferecer volumoso. Isso é muito bom, porque mantém a alimentação do gado que está dando mais retorno à propriedade, evitando o risco de queda na produção no período de transição.”
O coordenador alerta, no entanto, que só pode pensar em instalar sistema de irrigação quem tem água na propriedade. “Além disso, a irrigação tem de estar associada à fertilidade do solo e ao manejo correto da pastagem.”