Das andanças que fazia pela Serra da Canastra (MG) para lembrar dos passeios que fazia com o avô quando adolescente, Fernando Oliveira começou a levar para São Paulo exemplares do célebre queijo produzido por aquelas bandas. Com formação em sociologia e então professor, ele os dava de presente e revendia a familiares e amigos, mas os pedidos foram se tornando cada vez mais numerosos e virou um negócio.
Hoje, dono da loja A Queijaria, em São Paulo, ele é referência nesse mercado: o estabelecimento comercializa 230 variedades de queijos artesanais vindos de treze estados brasileiros, fornece para restaurantes badalados como o D.O.M., de Alex Atala, e vende mensalmente cerca de 1,2 tonelada do produto, o que rende ao negócio um faturamento médio de R$ 72 mil a R$ 84 mil. O preço das peças varia de R$ 45 a R$ 350.
A faísca que fez Oliveira abrir a marca e com ela causar um movimento de redescoberta do queijo artesanal brasileiro surgiu do encontro com Zé Mário, produtor tradicional localizado a quatro quilômetros do centro de São Roque de Minas, na região da Serra da Canastra. “Ele é o grande responsável por todo esse movimento”, diz o empreendedor. “Quando o encontrei, ele era um dos últimos a ainda produzir aquele queijo. Ganhava menos com o produto do que se vendesse só o leite e por isso era ridicularizado na cidade.”
Esse foi o primeiro de uma série de produtores encontrados por Oliveira. “Ao perceber que o porta-malas do meu carro voltava cada vez mais cheio para presentear conhecidos, ele me perguntou: ‘Por que você não os vende? Isso o ajudaria a pagar a viagem’”, diz Oliveira. Hoje, A Queijaria trabalha com mais de 70 produtores espalhados pelo país e o queijo cultivado por “seu” Zé Mário, como é conhecido, já foi premiado nacional e internacionalmente.
O negócio começou primeiro online em 2008, depois de dois anos de pesquisa. “A internet era a forma mais fácil, na época eu nem pensava em ter um espaço físico.” Mesmo sem um plano divulgação, o site delivery Queijo Artesanal cresceu, assim como o interesse de Oliveira pelo assunto: “me comovi depois de perceber como a produção caia vertiginosamente e estava marginalizada”.
Em 2013 foi inaugurada a loja física, instalada na Vila Madalena, em São Paulo. A aposta no boca-a-boca se manteve. Até hoje a empresa não tem assessoria de imprensa ou uma placa com o nome da loja para atrair os pedestres que passam por ali. “Colocamos como conceito uma forma orgânica de crescimento”, afirma Oliveira. “Desde o princípio queríamos replicar a ideia de uma fazenda, um recanto na cidade que fosse sendo divulgado por quem o conhecesse.”
Além de vender queijos, A Queijaria comercializa produtos relacionados, como embutidos, vinho, mel, geleia e goiabada. Oliveira também promove eventos, cursos, excursões guiadas pela Serra da Canastra e em setembro começou a vender ingredientes para que os clientes possam fazer o próprio queijo. “Mesmo que o cliente não compre, ele aprende algo novo ao entrar na loja.” Todos os dez funcionários hoje empregados pelo estabelecimento («até o controlador de acesso») são treinados e levados a conhecer a Serra da Canastra para entender o processo desde a fonte.
O plano agora é aumentar a cadeia de produtores com a qual trabalha. “Muitos deles já vendem para empórios como o meu, mas outros tantos não têm acesso à informação e sequer sabem da existência desse mercado, o que os leva a vender a preços baixíssimos a fábricas de pão de queijo, por exemplo”, diz. “Hoje há espaço para muita gente, basta fazer a conexão.”
Em 2017 ele quer desenvolver pelo menos um produtor em cada uma das 74 cidades reconhecidas pelo IMA (Instituto Brasileiro de Agropecuária). O contato com eles é peculiar. Oliveira, que costuma viajar sempre de carro e estima já ter feito 80 viagens só para a Serra da Canastra desde que abriu o negócio, afirma que é possível levar até três anos para desenvolver uma relação de confiança com os produtores.
“Não digo que isso vá acontecer no ano que vem ou daqui a dez anos, mas tenho certeza que o Brasil vai virar a pátria do queijo”, diz, otimista. “Pode soar exagerado falar uma coisa dessas, mas o consumo brasileiro desse produto tem crescido cerca de 10% ao ano. O trabalho me fez conviver com muitos europeus e eles estão de olho no crescimento do nosso mercado. Ninguém tem a diversidade que nós temos.”